Uruguai Aprova Lei de Eutanásia e Debate Sobre a Vida Reacende

Uruguai Aprova Lei de Eutanásia e Reacende Debate sobre o Valor da Vida

O Senado do Uruguai aprovou na quarta-feira, 15, o projeto de lei denominado “Morte Digna”, que legaliza a eutanásia sob certas condições. Esta decisão histórica faz do Uruguai o primeiro país da América do Sul a legalizar a prática de forma legislativa, após um longo período de debates políticos e éticos. A nova legislação, que recebeu 20 votos favoráveis de um total de 31 senadores, descriminaliza a eutanásia, permitindo que indivíduos com doenças incuráveis e sofrimento considerado “insuportável” solicitem assistência médica para encerrar suas vidas.

A proposta já havia sido aprovada anteriormente pela Câmara dos Deputados em agosto, e agora aguarda apenas a regulamentação por parte do governo. Até o momento, na América Latina, apenas a Colômbia e o Equador haviam permitido a prática através de decisões judiciais, tornando o Uruguai pioneiro em sua institucionalização por meio do parlamento.

Um Debate de Cinco Anos e uma Nação Dividida

A votação marca o fim de cinco anos de discussões intensas que polarizaram o país. Pesquisas indicam que aproximadamente 62% da população apoia a nova legislação, enquanto 24% são contrários. Parlamentares da coalizão de esquerda Frente Ampla argumentaram que a lei atende a uma “demanda social legítima”. A senadora Patricia Kramer, uma das principais defensoras do projeto, afirmou: “A opinião pública está nos pedindo para assumir isso”.

Outro parlamentar, Daniel Borbonet, ressaltou que “a vida é um direito, mas nunca deveria ser uma obrigação, especialmente quando se trata de um sofrimento insuportável”. Durante a votação, o clima no plenário foi carregado de emoções, com reações variadas nas galerias: algumas pessoas gritaram “assassinos”, enquanto outras celebraram a aprovação com aplausos e abraços. Um dos apoiadores da proposta, Beatriz Gelós, de 71 anos, que vive com esclerose lateral amiotrófica (ELA), declarou: “É uma lei de compaixão, muito humana. Me daria uma paz incrível ver isso aprovado”.

Resistência da Igreja e de Organizações Religiosas

A maior oposição à eutanásia veio da Igreja Católica e de organizações cristãs, que consideraram o texto “limitado e perigoso”. O Conselho dos Médicos do Uruguai também expressou preocupações sobre a falta de garantias legais para os profissionais de saúde e os pacientes. O pastor e teólogo Samuel Valério, doutor em Ciências da Religião, argumentou que a medida contraria os princípios da fé cristã e o valor intrínseco da vida. “Como cristãos, nós nos posicionamos contra, porque entendemos que a vida está nas mãos do Senhor. É Ele quem pode dar e tirar a vida”, afirmou.

O pastor reconheceu a dor enfrentada por aqueles que lidam com doenças graves, mas defendeu que o papel dos cristãos é permanecer firmes na esperança. “Nós, como cristãos, somos a favor da vida, sempre a favor da vida. Somos contra a pena de morte e contra a eutanásia. Qualquer tipo de violação da vida deve ser contestada, pois somente Deus tem essa prerrogativa”, disse. Para ilustrar sua posição, ele citou o exemplo bíblico de Jó, que mesmo após perder tudo, glorificou a Deus: “O Senhor deu, o Senhor tirou, louvado seja o nome do Senhor”.

O Uruguai como Referência Liberal na América do Sul

A legalização da eutanásia solidifica a imagem do Uruguai como uma das sociedades mais liberais da América Latina. O país já havia sido um precursor na legalização do aborto, do casamento entre pessoas do mesmo sexo e do uso recreativo da maconha. A nova legislação permite apenas a eutanásia, que deve ser realizada por profissionais de saúde, e não abrange o suicídio assistido, que envolve a autoadministração de substâncias letais.

Diferentemente de países como Austrália e Nova Zelândia, o texto uruguaio não estabelece um limite de tempo de vida para o paciente. A única condição é que o sofrimento seja considerado “insuportável” e que a pessoa esteja mentalmente apta para tomar a decisão, com a aprovação de dois médicos. Enquanto o governo se prepara para a regulamentação, líderes cristãos alertam que a aprovação da eutanásia representa um desafio ético e espiritual crescente na região. “Precisamos orar para que o valor da vida seja preservado, mesmo em tempos de dor e desespero”, concluiu o pastor Samuel Valério.

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